A genética de um animal é como um manual de instruções que conta como aquele bicho deve se comportar na natureza e quais ferramentas ele terá para se defender, por exemplo. De tempos em tempos (muito tempo, na verdade) esse manual é atualizado, com novas diretrizes.

Essas novas orientações sobre a genética do animal que evoluiu podem fazer com que uma parte do seu corpo que antes era fundamental para a sua sobrevivência se torne obsoleta, milhares de anos depois. Será esse é o caso das pseudopatas, ou patas falsas, das lagartas? As lagartas têm três pares de patas, seis pernas no total. Elas são articuladas e cumprem as funções que se espera desses membros, como ajudar o inseto a se locomover.

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

Mas você pode estar se questionando, pois quem observa esses insetos vê um número maior de patas. Acontece que além dos membros funcionais, as lagartas têm até dez pseudopatas.

Por que as lagartas têm patas falsas?

Os biólogos ainda não têm uma resposta definitiva para essa pergunta, mas hipóteses interessantes sobre esse tema surgem sempre. Recentemente, pesquisadores da Faculdade de Ciências Biológicas da Universidade Nacional de Singapura (NUS) compartilharam um novo estudo sobre o tema.

Até agora, existem três hipóteses sobre as patas falsas: seriam patas com alguma função; seriam membros com funções ainda desconhecidas, ou seriam membros-apêndices que já não têm serventia alguma.

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

“As três principais teorias sobre as pseudopatas sugeriam que elas poderiam ser pernas torácicas modificadas, características completamente novas ou lóbulos modificados (enditos) de pernas torácicas primitivas”, explicou a professora Antónia Monteiro, que liderou o time de investigadores.

Contudo, o estudo dos cientistas da NUS propõe mais uma alternativa para explicar as patas falsas: “Nosso estudo propõe que elas sejam, de fato, características novas não relacionadas às pernas torácicas. No entanto, elas são derivadas de um programa genético que especifica lóbulos originalmente encontrados na região próxima aos membros dos crustáceos, mas permaneceram inativos nessa região durante milhões de anos”.

Portanto, segundo essa pesquisa, as pseudopatas não são patas que se modificaram com o passar do tempo por não terem mais utilidade.

Cientistas fizeram testes genéticos nas lagartas

No início desta matéria, comparamos os genes dos animais com um manual de instruções. Nesse caso, as patas falsas seriam como aquela peça que sobra quando abrimos um equipamento — e que indica que erramos na montagem.

Assim, os pesquisadores fizeram alterações genéticas em cobaias de lagartas da espécie Bicyclus anynana para entender como e porque o corpo desses insetos produzia as pseudopatas.

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

O Mistério das Pseudopatas: Como a Evolução Genética Transformou Partes Obsoletas em Ferramentas Vitais para Lagartas

Os cientistas isolaram um gene específico e perceberam que isso fez com que as patas falsas sumissem completamente. Quando esse isolamento era parcial, elas ressurgiam acompanhadas de patas funcionais modificadas, que assumiam um papel de glândulas.

Na prática, isso significa que a genética desses animais desenvolveu um novo membro para as necessidades atuais da lagarta, baseando-se no design de um membro antigo desses bichos. Essas informações ficaram armazenadas nos genes desses animais e foram reutilizadas quando foi preciso.

Assim, as pseudopatas não são resquícios inúteis do passado. Elas seriam uma parte nova e funcional da lagarta baseada em um membro que esse animal teve em um passado muito distante, como se uma peça nova fosse criada a partir do desenho de uma antiga e, agora, inútil.